A aplicação do ozônio na pós-colheita de uvas (Vitis vinifera) configura-se como uma solução tecnológica sustentável, altamente eficaz para a manutenção da integridade microbiológica e físico-química do produto, promovendo a extensão da vida útil e o controle de perdas durante o armazenamento.

Dada a elevada perecibilidade dessa fruta, aliada à sua sensibilidade à contaminação por microrganismos deteriorantes como bolores e leveduras, torna-se imperativo o desenvolvimento de metodologias que assegurem sua conservação sem comprometer a segurança alimentar nem o valor nutricional.

Desafios Pós-Colheita e Potencial do Ozônio

As uvas, amplamente utilizadas tanto para consumo in natura quanto como matéria-prima para a indústria de sucos, passas e vinhos, são ricas em compostos bioativos, destacando-se os polifenóis com propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e quimioprotetoras.

Entretanto, estima-se que perdas pós-colheita possam atingir até 25% nos países industrializados e superar 50% em regiões em desenvolvimento, com a degradação microbiológica como um dos principais vetores.

Tradicionalmente, agentes químicos como o dióxido de enxofre (SO₂) têm sido utilizados no controle microbiológico. Apesar de sua eficácia, esses compostos geram subprodutos potencialmente tóxicos. Nesse cenário, o ozônio (O₃) surge como alternativa de alta eficiência oxidativa e ambientalmente segura.

Mecanismo de Inativação Microbiológica

O ozônio atua por oxidação da parede celular e das membranas plasmáticas dos microrganismos, causando danos irreversíveis. Bolores e leveduras, como Aspergillus, Penicillium, Candida e Hanseniaspora, demonstram alta sensibilidade ao ozônio, especialmente em formas combinadas (gás e névoa).

Ozônio na pós colheita de uvas: Metodologia Experimental

Uvas brancas foram tratadas com ozônio em três modalidades: gás, névoa ozonizada (30,10 mg L⁻¹) e combinação de ambos, por 3, 5 e 10 minutos. Os frutos foram armazenados por 21 dias a 10 °C e 20 °C, com análises semanais de qualidade microbiológica e físico-química.

  • Parâmetros microbiológicos: bolores e leveduras totais
  • Parâmetros físico-químicos: sólidos solúveis (°Brix), firmeza, pH e pigmentação

Resultados Microbiológicos

Os tratamentos com ozônio foram eficazes na redução da carga microbiológica:

Temperatura Tratamento Redução – Bolores (log CFU/g) Redução – Leveduras (log CFU/g)
10 °C Névoa 1,10 1,61
10 °C Gás 1,24 1,81
20 °C Névoa 1,00 1,45
20 °C Gás 1,06 1,37

Qualidade Físico-Química

  • Sólidos solúveis (°Brix): preservados e, em alguns casos, aumentados
  • Firmeza: mantida sem perda significativa
  • Cor e pigmentos: maior preservação de clorofila A, B e antocianinas em uvas ozonizadas

Implicações Técnicas e Sustentabilidade

Além da inativação microbiológica, a ozonização contribui para a logística e sustentabilidade da cadeia produtiva, reduzindo perdas, necessidade de refrigeração e uso de químicos sintéticos. Sua implementação em packing houses é viável, desde que acompanhada por protocolos de segurança ocupacional.

ConclusãoO ozônio destaca-se como uma tecnologia eficaz e sustentável para a conservação de uvas na pós-colheita. Seu uso proporciona ganhos em segurança microbiológica, manutenção da qualidade sensorial e atendimento às exigências de mercado por alimentos livres de resíduos químicos.

Referências Técnicas

  • Sitoe, E. P. E. et al. (2023). Avaliação da eficiência do ozônio na conservação pós-colheita de uvas. UNICAMP/MyOzone.
  • World Health Organization. (2008). Guidelines for the safe use of wastewater, excreta and greywater.
  • Tiwari, B. K. et al. (2010). Applications of ozone in food processing. Journal of Food Science, 75(9), R112–R117.
  • ANVISA. (2023). Resolução RDC n.º 275: Regulamento técnico de boas práticas para serviços de alimentação.